As entidades superiores

Estacionei o carro ao fundo da Rua Alferes Malheiro, que acaba justamente no cruzamento onde fica a Ordem da Trindade. Passei o dia a colocar consecutivos talões de parcómetro no carro, não fosse aparecer um polícia municipal com vontade de me deixar um “postal de Parabéns” no pára-brisas.
Numa das vezes, por volta das 17h, dirigi-me ao cimo da rua para comprar mais duas horas de descanso e comecei a descer a rua em direcção ao carro. À minha frente seguiam mãe e filha, de raça negra, carregando “a meias” um saco de compras que parecia bem pesado. Tentei passar para a sua frente mas não consegui. Fiz então barulho com os pés, assinalando a minha presença. A mãe reagiu de imediato, dirigindo-se à filha com extrema educação, que nisto de se ser educado não é uma via de sentido único e há que dar o exemplo:
“Luana, deixa passar o senhor, se fazes o favor.”
Arrepiei-me, incrédulo, mas duvidando de que tivesse percebido bem. Parei, no entanto, e perguntei à senhora se tinha ouvido mal ou se o nome da filha era Luana, recebendo a sua confirmação mas também a sua estranheza pela minha interpelação. Justifiquei que o meu espanto se devia ao facto do nome ser invulgar e à coincidência de ter uma filha com dois dias de vida “ali, na Ordem da Trindade, naquela janela que se vê daqui” com o mesmo nome.
Se vos disser que o nome Luana tem origem africana e que se trata de uma abreviatura de Luanda, a cidade onde nasci, compreenderão melhor o facto de eu ter realçado o facto daquela mãe e daquela Luana serem de raça negra.
Se calhar, foram “as entidades superiores” da minha Mãe-África que quiseram dar-me um sinal de terem abençoado a nossa Luana. Assim seja!