20 setembro 2009

A minha avó Marfida

Faria hoje anos a minha avó Marfida (não é erro no nome, é mesmo assim!). Mãe da minha mãe, valeu para mim mais do que duas mães. Foi ela quem me criou enquanto os meus pais trabalhavam, foi daquelas avós para quem está sempre tudo bem, das que fazem as vontades impossíveis aos netos e que ainda por cima têm sempre uma notinha bem dobrada para dar sem que se peça e sem que ninguém veja.
Foi sempre uma mulher de trabalho. Passou a vida atrás do fogão onde fazia uma muamba, uns rissóis, um arroz de forno e uma açorda de polvo que ainda não encontraram rival. Tratou do marido, da filha, da casa e mais tarde dos netos. Apesar de ter esse papel fundamental, anulava-se sempre para ceder o centro do palco aos outros. Excelente ouvinte, adorava ver a casa cheia e assistir a uma boa conversa numa roda de amigos e nunca intervinha, a menos que fosse directamente incentivada.
Passou o cabo dos trabalhos comigo, manhãs inteiras a subir e descer escadas para me conseguir tirar da cama quando eu decidia fazer gazeta à faculdade. Era até perder a paciência mas mal eu me levantava dava-me todo o carinho de que era capaz.
Em Angola vivíamos em casas vizinhas mas cá em Portugal vivemos os últimos quinze anos da vida dela na mesma casa. Sempre que eu chegava, parava tudo o que estivesse a fazer para me fazer um lanche que ainda hoje me deixa saudades, com torradas e uma chávena de cevada.
Sofreu a vida toda de uma doença óssea que lhe provocava dores em todo o corpo mas estava sempre pronta para ir fazer alguma coisa para alguém, fosse o que fosse, e sem que ninguém lhe pedisse. Noutra vida deve ter sido escrava, subalterna foi com certeza.
Depois dela, algumas coisas perderam razão de ser. E a cevada também. Nenhuma tem o mesmo sabor!
Um beijo, Vó!

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